Começo com esse título engraçadinho, meio pinterestizado, e consigo quase que ver a frase escrita em rabiscos bonitinhos, e uns traços aquarelados em volta.

Todo mundo tem uma receita pronta sobre como tudo deveria ser.

Eu tenho uma receita também.

E, mesmo na minha receita, eu me perco o tempo todo.

Você tem aquela ideia de como deve ser a vida depois que você atinge, hum, alguma tranquilidade profissional. Eu fazia planos de quando eu tivesse x ou y, como eu dividiria o meu tempo.

Lá, no futuro calmo das ideias, eu faria ioga, leria e releria livros, assistiria a todas as séries que tivesse vontade. Também me presentearia com jantares em restaurantes legais com amigos queridos. E viajaria nas férias.

Acontece que o futuro nunca chega, porque você continua o projetando pra frente. E, enquanto isso, o presente é coisa que está soprando responsabilidades no cangote.

Com toda essa organização em mente, você começa a semana. Um dia, as reuniões te prendem e você não consegue ler ou responder os e-mails. Chega na mesa ao fim do dia e pensa: fico só mais uns minutinhos.

O tempo voa e, quando você se dá conta, é a última do escritório. Está levando trabalho pra casa, está correndo de um lugar para outro. Tudo meio mal acabado. Se eu tivesse tempo… (joga para o futuro, de novo, porque o presente já atropelou os planos).

Assim, passam-se dias, semanas, meses, finais de semana em que você deu uma trabalhadinha de casa porque não tinha nada planejado mesmo. Nem dá pra lembrar direito a última vez que viu os amigos. Que visitou a família. O bebê da melhor amiga já tem dentes, e parece que ele nasceu ontem. Onde você estava que não acompanhou isso?

Eu adoraria ser pessoa que sabe exatamente como dividir o tempo.

Eu me atropelo, priorizo errado.

Chego na sexta-feira tão cansada que só consigo pensar em deitar no sofá.

Na minha cabeça existem sábados maravilhosos de almoços no boteco da esquina, feijoada na mesa na calçada. Domingos de bicicleta no parque. Novas receitas, novas viagens, cinema.

A gente sabe o que tem que fazer. A gente sabe exatamente o que precisa ser cortado, diminuído. O problema é dar o primeiro passo.

Ainda em 2016, eu me prometi não levar trabalho pra casa. Não deu certo durante meses, até que um dia eu dei o primeiro passo. Depois dele, ficou fácil. Hoje, dificilmente meu computador anda comigo. Ele fica repousando lindamente na mesa do trabalho.

O mundo não acabou, com isso. O mundo continuou igualzinho.

Ninguém nem notou que eu estava trabalhando um pouco menos, assim como ninguém notava quando eu trabalhava um tantão a mais.

A grande mudança foi interna. A cabeça acalmou, eu fiquei menos ansiosa.

Eu reencontrei a leveza em fazer o meu trabalho. Eu gosto do que eu faço. Só estava mais pesado do que precisava ser.

Tendo desapegado, eu consegui delegar, confiar, dividir. Foi o suficiente? Óbvio que não. Tem chão, ainda. Mas o primeiro passo, aquele mais difícil, foi dado.

Agora, desse novo lugar, em que trabalho mora no trabalho, sobram horas no dia.

Dá pra ir ao cinema, dá pra ver os amigos. Dá pra dormir e assistir seriados em looping. Dá até pra pensar em novas ocupações. Quem sabe aulas de cerâmica? Quem sabe um retorno à ioga?

A vida é aqui fora. E é boa, deixa eu contar pra vocês.

O único grande plano pra 2017, aquele que eu não vou me permitir esquecer, é esse: viver a vida aqui fora.