Na semana passada, circularam nas redes sociais duas histórias que me chamaram a atenção a respeito da guerra fria entre maternidade e mercado de trabalho.

A primeira foi a de uma candidata a gerente financeira que desabafou, sentindo-se discriminada por não ter passado no processo seletivo de uma grande empresa, apesar de os recrutadores terem dito que ela era a profissional perfeita para a posição. O motivo? Ser mãe de duas crianças pequenas.

Outro caso foi o de uma jornalista que, sabendo de antemão que mães não seriam escolhidas para determinada vaga, mentiu e disse que não tinha filhos, mesmo sendo mãe de dois.

Essa não é a primeira vez que ouvimos casos como esses. Recentemente, uma pesquisa mostrou que 3 em cada 10 homens acham mais justo terem chefes homens, já que as mulheres engravidam.

Por essas e outras, dá pra se ter uma boa ideia de como, se ser mãe é padecer no paraíso, ser mãe executiva é padecer no mundo corporativo.

Mas por que tanto tabu em torno desse ser quase mitológico que é a mãe que trabalha fora de casa?

Car@s amig@s, se em pleno século XXI, mesmo tendo conquistado seu espaço por mérito e luta, as mulheres sofrem discriminação no trabalho, muitas vezes ganhando menos que seus pares do sexo masculino, aguentando machismo velado ou descarado no dia a dia e, em casos mais graves, até assédio, imaginem as mães.

Para sobreviverem aos jogos vorazes corporativos e ascenderem na pirâmide, as mulheres têm que, muitas vezes, disfarçar algumas de suas características mais preciosas, como sensibilidade e intuição. Poucas são as empresas que, inteligentemente, sabem enxergar e aproveitar esses diferenciais femininos. E com as mães, essa receptividade do mercado é ainda menor.

É claro que existem empresas que são pontos fora da curva e proporcionam condições para que a mulher possa exercer seus múltiplos papéis de maneira confortável. Mas não se trata apenas de estrutura.

Se uma empresa é feita de pessoas, a mudança precisa ser cultural, na forma de agir e pensar daquela comunidade.

Em mais de dez anos de mundo corporativo, vivi ou acompanhei diversas histórias ocorridas simplesmente porque o sistema não foi desenhado para compreender essa multiplicidade da mulher.

Até muito pouco tempo atrás, a mãe era a que ficava em casa, cuidando dos filhos, sem formação intelectual ou ambições profissionais. Como fazer o mercado entender que, hoje, a mesma mãe que cuida da criação, bem-estar e educação dos filhos pode ser também a profissional que inova, agrega, administra projetos, equipes e budgets milionários?

A falta de empatia começa na gestação. Já vi muita grávida com medo de dar a notícia ao chefe, sem saber como ele reagiria, mesmo quando o chefe em questão era mulher (pois é, sororidade, palavra da moda, é artigo de luxo), e depois com medo do que aconteceria após a licença maternidade.

Daí, quando retorna ao trabalho, após os ajustes necessários e sofridos, que incluem decidir entre avó, berçário (que, por melhor que seja, deixa a gente sempre com uma sensação de estar guardando o bebê na chapelaria) ou babá (geralmente uma mãe que deixa os filhos dela com alguém para poder tomar conta dos nossos), começa uma adaptação de ambos os lados à nova realidade.

Oi, empresa, tudo bem? Então, sabe aquela profissional que antes vivia para o trabalho, sem hora para sair do escritório? Pois bem. Ela agora tem outras prioridades, que incluem o horário de fechamento do berçário ou de render a babá, tá bem?

Não, infelizmente, na maior parte das vezes não está tudo bem.

E, assim, a mamãe executiva constantemente tem que engolir aqueles olhares enviesados e sua própria culpa ao se levantar e pegar sua bolsa, no fim do expediente.

Tem dias em que fica adiando a hora de ir embora e deixa para o último minuto. Só que ela mora numa cidade grande, onde o trânsito é normalmente ruim, podendo piorar. E, quando piora, ela se atrasa e recebe telefonemas do berçário, dizendo que seu filho é a última criança ainda ali. Ela pede milhões de desculpas, promete que é a última vez e chora nervosa ao volante, completamente impotente.

Algumas mulheres se esquematizam para não passarem por isso e arrumam alguém que possa ficar até mais tarde com as crianças. Mas também pagam um preço caro por isso, que é o de não conseguir tempo com a família.

Já vi colega chorando ao desligar o telefone, depois de dizer baixinho pro filho: “é, não vai dar pra mamãe jantar com você hoje de novo, mas semana que vem vou tentar sair mais cedo…”

Quando a mãe ainda amamenta, o grau de dificuldade para conciliar tudo é ainda maior. Corre para o banheiro com a bomba de leite, esvazia o peito, arruma uma geladeira para deixar o vidrinho armazenado até a hora do almoço, que é quando atravessa a cidade de carro para entregar a mamada e volta engolindo um sanduíche.

Não demora muito e começam as fases das doencinhas infantis – o que costuma acontecer com mais frequência justamente quando eles são pequenos e a mãe executiva ainda está aprendendo a lidar com a nova rotina.

Mesmo que deixe os filhos com alguém de confiança, que vai cuidar direitinho deles, possivelmente continuará angustiada e culpada, pensando que criança doente quer colo de mãe.

E quando ela vai entrar numa reunião importante e recebe um telefonema dizendo que seu filho não para de vomitar? Aí não tem jeito: é sair apressada, enquanto tenta reagendar ou pedir pra que alguém a substitua.

Parece que vai ficar mais fácil quando as crianças forem crescendo, mas nunca fica. As situações é que mudam e a mãe executiva fica mais calejada. E são muitos os obstáculos: daquela viagem de negócios no dia do aniversário do filho à reunião com o presidente da empresa bem na hora da apresentação de balé.

Porém, se existem os ônus, muitos são também os bônus da mãe executiva.

Aqueles homens que disseram na pesquisa que preferem chefes homens porque mulher engravida não têm ideia do que estão falando. Primeiro porque nem todas as mulheres se tornam mães.

E as que fazem essa escolha engravidam quantas vezes na vida? Uma? Duas? 1,77, pra ser mais precisa, de acordo com o último censo do IBGE. Em compensação, em todos os anos de vida profissional após a maternidade, a empresa ganha uma profissional multitarefa e, geralmente, segura de si.

Quem melhor que uma mãe para ser gestora? Mãe executiva leva os filhos ao médico, vai à reunião de pais, delega as tarefas domésticas, trabalha, passa no supermercado porque o leite acabou e, quando chega, arruma as mochilas para amanhã e ainda conta histórias para o filho dormir, tudo no mesmo dia.

E se ela tem que sair no horário combinado da empresa para buscar as crias, não significa que o expediente acabou ali. Para a mãe executiva, time is money. Volta a trabalhar de casa depois que as crianças dormem. Responde e-mails e faz telefonemas enquanto empurra o carrinho do mercado ou espera o frentista abastecer o carro.

Mãe executiva aproveita bem o seu tempo no escritório. Senta e resolve. Se a agenda estiver apertada, trabalha no horário de almoço. Mãe executiva se dedica. Ela sabe que a carreira, além de realização pessoal, também significa o conforto e o futuro da família. Além disso, quer que os filhos se orgulhem dela.

Mãe executiva é uma profissional autoconfiante. Tem que defender orçamento pro CEO? Fazer uma apresentação pra uma equipe de 300 pessoas? Prospectar novos clientes?

Amig@s, desafio mesmo é passar a noite acordada no hospital com o filho com falta de ar ou febre de 40 graus. É ter uma palavra sábia pra dizer àquele tico de gente que chegou chorando da escola porque o amiguinho disse isso ou aquilo, apesar da vontade de passar a mão no telefone e dizer uns desaforos pro tal moleque. É se acalmar enquanto faz o curativo da criança que caiu e não para de sangrar.

O resto é mamão com açúcar.

Mãe executiva sempre dá um jeito, equilibrando e rodando os muitos pratinhos sem deixar nenhum cair.

Às vezes, sim, ela se chafurda na culpa e chora, cansada, no travesseiro, se martirizando e achando que está fazendo tudo errado, que não vai conseguir continuar. Mas, no dia seguinte, levanta e recomeça a gincana.

O mercado de trabalho taí para ser conquistado, os filhos não vão se criar sozinhos.

O show da mãe executiva não pode parar.