Tive uma vizinha que era a personificação do zelo.

Dedicava grande parte do seu dia à educação de seus dois meninos e a cuidar de seu sobrado – sim, como se o imóvel fosse seu terceiro filho.

Ela amava sua casa. Sentia-se feliz por ter escolhido cada pedacinho que seus olhos poderiam percorrer: do gesso do teto à torneira da lavanderia. Sabia que ali seria o lugar sagrado das memórias de infância da sua prole.

Só que o tempo passou, os filhos cresceram e a morada não cabia mais nos sonhos e ambições da família.

Em uma noite, um caminhão ali parou, colocaram nele seus objetos e foram embora.

O marido, orgulhoso em adquirir um apartamento todo mobiliado perto da avenida principal, recebia sua recompensa pelas horas ausentes com a família. Trabalho, né? Sabe como é.

Durante a mudança, ela não sabia o que era mais difícil abandonar: sua amada casa ou seu papel como mãe de duas ex-crianças (sim, haviam crescido). De tutora para aconselhadora, da que pega pela mão para aquela que apenas aponta o dedo.

No dia seguinte, ela retornou para sua antiga casa com a desculpa de pegar um vaso que tinha esquecido lá. Na verdade, desejava se despedir, rememorar os momentos tão preciosos em família que passaram juntos naquele lugar querido.

O filho mais velho a acompanhava e, sem entender metade da angústia de sua mãe, ordenou que logo fossem embora. O futuro os esperava. Última olhada. Vamos, mãe!

Depois de algum tempo, uma nova família se instalou na casa vizinha. Batiam portas, arrastavam móveis, construíram até um puxadinho desordenado nos fundos. A cada final de semana, festas, música alta, vômitos e garrafas espalhadas pelo quintal. A casa era outra: tumultuada, caótica, barulhenta.

Ao notar tamanha transformação, eu pensava na antiga vizinha. O que ela acharia daquilo tudo?

Lembrei que toda vez que passo em frente à minha casa de infância e vejo o consultório dentário em que se transformou, sinto-me ligeiramente triste. Não sei se a melancolia em mim é pela observação da frieza de um consultório, ou pela saudade dos tempos vividos. Provavelmente uma mistura dos dois.

A vida é como um rio que flui e não anda para trás. Por melhores e mais amáveis que os momentos ou as fases anteriores tenham sido, às vezes é preciso agradecer, dizer-lhes adeus, abandoná-los.

Talvez seja mais saudável para nossos olhos e ouvidos não acompanhar o que já deixamos: um relacionamento, um emprego, uma amizade, a casa dos pais ou outro ambiente qualquer.

Guardar na memória e perto do coração os bons acontecimentos e marchar rumo ao desconhecido, com a esperança de que cada momento de nossas vidas seja, logo mais, uma nova boa lembrança.