Meu marido e eu sonhávamos com um ano sabático, viajando pelo mundo. Pensava partir com nossos filhos maiores para que aproveitassem mais e também se recordassem quando adultos dessa fantástica experiência.

Até que contei meu sonho a uma amiga querida, que me perguntou: “Você se lembra das viagens que fez?”. Comecei a buscar recordações.

Minha primeira viagem longa foi aos 15 anos. Escolhi como presente de aniversário percorrer o Nordeste brasileiro. Com meus pais, de carro. Naquela época, há 30 anos, minhas amigas preferiam debutar num baile ou numa excursão para Disney.

Com 25 anos, morei em Tóquio e atravessei o país, de Okinawa a Hokkaido. Desde então, mochilei pela América do Sul, México, Canadá, África do Sul e Europa, onde andei 800 quilômetros da cordilheira Pirineus (França) até Compostela (Espanha).

De algumas destas viagens, mantenho apenas flashes na memória. Mesmo quando tento recordar, como agora, não me lembro da história nem dos nomes de muitos dos pontos turísticos visitados ou dos pratos culinários experimentados.

No entanto, as sensações que me proporcionaram ainda vibram forte em mim.

Compreendi a que se referia minha amiga.

Eu sou o que vivi, o que experimentei, por onde percorri. E isso não depende apenas do que consigo recordar.

Colocado assim, parece óbvio. Mas, no dia a dia, o que temos vivido? O que temos experimentado? Que caminhos temos percorrido?

Essa conversa me fez querer antecipar o sabático em família. Nada de esperar mais 10 anos, até os filhos crescerem.

Em 2014, meu marido foi trabalhar na Cidade do Panamá e moramos lá por quatro meses. Aproveitamos para viajar pelo país e esticamos até os Estados Unidos. Nossos sobrinhos, na época com 12 e 14 anos, moravam em Denver. Alugamos um motorhome e embarcamos rumo a Yellowstone, Zion, Las Vegas e Grand Canyon. Estávamos empolgados com a oportunidade de compartilhar essa “aventura” com nossos pequenos filhos e com os sobrinhos maiores.

Rafael, 4 anos, e Sofia, 10 meses, curtiram muito. Rafael perguntava tudo: cadê os ursos do parque (Yellowstone), por que a montanha é vermelha (Parque Zion); por que tantas luzes (Las Vegas)? Sofia tinha como lugar preferido a janela, onde se tranquilizava durante as horas de deslocamento no motorhome. Quando estacionávamos, ela se agitava querendo logo sair do veículo. Enquanto nos organizávamos, ficava à vontade junto ao irmão, no chão mesmo, explorando as novas paisagens.

Nossos sobrinhos adolescentes, muitas vezes, nem saíam do motorhome. Passavam a maior parte do tempo com os olhos grudados no computador ou na tela do celular, até mesmo nas paradas para visitar pontos turísticos.

A partir dessa experiência, o sabático se tornou urgente!

Como não potencializar a enorme curiosidade dos pequenos? Quanto acolhimento eles têm para as descobertas, as sensações, as experimentações!

Só não partimos porque ainda não juntamos dinheiro suficiente para financiar a viagem e ficar um ano sem trabalhar. Enquanto isso, o pouco tempo livre é para pesquisar veículos, campings, barracas, contatar viajantes, levantar informações sobre homeschooling

No fim das contas, penso que nossa maior preparação foi chegar à convicção da partida.

Sim, porque, muitas vezes, ficamos uma vida toda colocando na balança os prós e contras para realizar este ou qualquer outro sonho. Gastamos todas as energias na análise e não vivemos a experiência. Com convicção, viabilizar passa a ser apenas um detalhe.