Pode parecer bem estranho, mas cada vez mais tenho cismado que essa síndrome assola a vida das pessoas. Não sou médica nem psicóloga, mas detectei sua presença inúmeras vezes, em vários casos críticos (sim, eu a considero bem grave).

A primeira vez que constatei a sua existência foi nos anos 90. Lá estava eu fazendo um mochilão pela Europa e tinha acabado de chegar a Roma, meu sonho dourado. Fui direto para o Vaticano visitar as obras da Capela Sistina e do museu do Vaticano. Ah, foi maravilhoso poder ver as obras dos grandes mestres da pintura! A voz aguda da minha professora de história da arte ecoava em minha mente (no bom sentido: cada obra me lembrava algum ponto que ela tinha explicado e mostrado em suas aulas, anos antes).

A síndrome atacou nos dias seguintes, em outros museus. Depois de tantas “Virgens e o Menino” e “Anunciações”, eu comecei a ficar meio… entediada.

Sério. No começo, avaliava o traço, o contexto, as texturas, luz e sombra, os símbolos. Depois, a coisa caiu na mesmice: as “variações sobre o mesmo tema” viraram uma sensação estranha de deja vu.

Eu não podia abandonar a viagem, e havia sonhado muito com aquilo. Mas as “Virgens e os meninos” e “Anunciações” iam se multiplicando. Sim, elas, que “deveriam” ser partes importantes da viagem (eu queria ver todos os grandes pintores italianos!).

Tive que engolir seco e cumprir o que eu mesma esperava de mim: visitar todos os museus possíveis e olhar todos os quadros possíveis. Afinal, eu estava na Itália! Não podia deixar de curtir aquilo com que tanto sonhei, em que tanto pensei, que tanto planejei.

Vou explicar: a “síndrome da Anunciação” é aquela sensação de tédio que segue uma sequência de “uaus”.

Aquele espanto, aquele clique, aquele brilho, aquela alegria se vão e, com muito esforço, a gente consegue seguir em frente sem o entusiasmo, sem o motor. É como comer a casca depois de devorar todo o recheio do sanduíche de forma. Ou quando sobra o bombom de passas ou de banana naquela caixa deliciosa que a gente devorou no final de semana. Um anticlímax.

Não sei por quê, mas muitas vezes a gente insiste em terminar o que começou e segue em frente, na sequência de quadros entediantes ou de ruas erradas, simplesmente por preguiça, inércia, teimosia ou para “riscar da lista”.

No meu caso, foram alguns museus e galerias de arte. Mas a coisa se complica quando as pessoas levam a vida assim: a rotina, os relacionamentos, a carreira, os estudos, as viagens, as compras, as atitudes. Aquilo se repete, desagrada, incomoda, mas seguem em frente, insistindo. É quando a vida perde o encanto. E isso é um grande desperdício de tempo e energia. 

Você deve estar se perguntando: “e por que será que ela está falando disso?”. Porque me senti na obrigação de alertar as pessoas sobre o mal da década (hoje em dia não há mal que dure um século, as coisas mudam muito rapidamente). Para não terminarem de ver os museus sem antes refletir. Pode ser uma pausa para um café, uma quebra na rotina.

Não deixe a inércia te manter tanto tempo sem aquele frio na barriga, aquela alegria contagiante que acelera o tempo.

Se o museu está chato, saia dele ou mude a narrativa, o roteiro, porque você ainda terá mil outras coisas incríveis para fazer. O caminho está errado, dê o sinal e desça do ônibus, mude o destino e troque a direção. Não tem jeito? Então tente mudar algo dentro de você ou na maneira como encara as coisas para se sensibilizar, para transformar aquilo que te incomoda. Sempre tem um jeito, o que falta é coragem para reconhecer o erro e força para corrigir o que, sim, tem conserto.

Minha irmã e eu começamos a fazer um ranking de quantas “Virgens e o Menino” e “Anunciações” a gente via, e isso foi bem divertido, só não lembro quem ganhou. Hoje, se refizesse o roteiro, com certeza haveria menos museus e mais pasta i vino regados a boas conversas.