Vira e mexe alguém faz questão de citar a receita da felicidade e da plenitude: plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro.

O autor da frase – um desconhecido que muito provavelmente não escreveu livro para contar histórias de seu filho ou colecionar folhas de sua árvore, do contrário, seria conhecido – parece inspirar muita gente. Mesmo com todos os questionáveis poréns envolvidos.

Com uma xícara de café em minha frente, encaro a quadragésima segunda-feira do meu trigésimo segundo ano.

E me sinto, mais uma vez, em dívida com o tal provérbio.

– E agora, como vou ser feliz? Não escrevi ainda o tal livro!

– Será que plantar muda de árvore tá valendo, ou tinha que ser com semente?

– E cadê a plenitude automática que deveria ter vindo quando tive filho?

É quase como se eu não fosse um ser humano completo: não fiz “check” nessas três ações místicas cruciais, não tive uma boa vida. Pobres os que morreram antes de completar a necessária missão.

Conheço pessoas muito felizes, obrigada, que nunca escreverão livros. Jamais terão filhos. Em hipótese alguma plantarão árvores. E aí, autor desconhecido? Terá sido em vão a vida de alguma delas? Terei eu, também, vivido inutilmente?

Tá bom. Não sejamos tão literais.

Há quem diga que plantar uma árvore é metáfora de deixar nossa colaboração para o mundo. Prover um tipo de semente que frutifique coisas boas. Nessa linha de raciocínio, ter um filho significa compartilhar conhecimento, trocar experiências, deixar uma parte nossa dentro de alguém – seja essa pessoa um herdeiro biológico ou não. Uma espécie de legado. Por último, escrever um livro é símbolo de registrar nossa história. Carpediar a vida.

Muito bonito, tudo isso.

Mas o fato é que estou um pouco cansada de viver de acordo com as expectativas dos outros.

Se você está solteiro, querem que esteja comprometido. Se escolhe um parceiro que não se encaixa nos padrões da família – mais pobre, menos instruído, mais ou menos qualquer coisa – era melhor ter ficado sozinho. Se casa, exigem filhos. Se por algum motivo não tem filhos ainda, onde já se viu?

Se tem uma carreira sólida e trabalha loucamente, dizem que está sacrificando a família. Se escolhe trabalhar menos e adota um estilo de vida mais simples, ah, que irresponsável. Se não tem certeza do que gosta, é um imaturo, mesmo. Se larga tudo para ir atrás do sonho, ihhhh, não sei não.

A pressão alheia muitas vezes nos faz abrir mão de nossos valores. Se, para mim, estabilidade é algo importante, porque me incomodo tanto com as milhares de pessoas bem-sucedidas (no Facebook) que estão largando tudo e virando nômades digitais?

Deveria conseguir ficar feliz com meu emprego estável, se meu filtro é “estabilidade”. Simples assim. Ah, mas e as postagens dos meus amigos felizes?

Que ótimo, se o filtro deles é outro. Sei qual é o meu – e vivo de acordo com ele.

Se tenho saúde – apesar de estar acima do peso “ideal” – e decidi aceitar minhas curvas e celulites, porque tenho vergonha de tirar a canga na praia? Os espanhóis nadam pelados e tem uma relação admirável de aceitação com seus corpos. Tão simples. Valores. Estou bem comigo, obrigada. Não me importo com o que a mídia diz que é bacana. O importante é que emoções eu vivi.

Aquela história de que nunca conseguiremos agradar a todos é a mais pura e a mais plena verdade.

Se eu for fiel a mim mesma, sem ofender aos que estão ao meu redor e me amam, saberei – e sentirei – que minha vida não terá sido em vão.

Desculpe, autor desconhecido. Para mim, isso basta.